Primeiramente, sabe-se que- para qualquer procedimento de usucapião- o tempo de posse não é o único requisito que deve ser cumprido. Todavia, o lapso de tempo em que o indivíduo está emposse do imóvel é um dos requisitos mais fáceis de se observar se está sendo atendido, ou não, pelo possuidor;
A posse, também, não pode ser simples. Ela deve ser qualificada: exclusiva, ininterrupta e sem oposição;
Segundo o Código Civil (2002), a depender da modalidade de usucapião que se objetiva e as peculiaridades do caso concreto, o tempo de posse necessário pode ser de 2, 5, 10, ou 15 anos;
O tempo de posse é requisito essencial para a usucapião pois define em qual o tipo legal se encaixa uma determinada situação.
No cotidiano brasileiro, é demasiadamente comum as transações informais de imóveis, ou seja, a compra e venda sem qualquer contrato feita com o antigo possuidor do bem. Nesta hipótese, para fins de regularização imobiliária, o Código Civil traz, em seu artigo 1.243, o princípio da acessio possessionis, que faculta ao possuidor atual a possibilidade de somar os tempos de posse:
“Art. 1.243. O possuidor pode, para o fim de contar o tempo exigido pelos artigos antecedentes, acrescentar à sua posse a dos seus antecessores (art. 1.207), contanto que todas sejam contínuas, pacíficas e, nos casos do art. 1.242, com justo título e de boa-fé"
Todavia, conforme doutrina de Fábio Caldas de Araújo (Usucapião, 2015), o somatório é possível não apenas em casos de transmissão intervivos, isto é, compra e venda e doação de imóveis, mas também em transmissões causa mortis;
A limitação à aplicação desse princípio é a posse de bens derivados de herança.
Transmissão causa mortis é aquela decorrente do óbito do proprietário de um determinado bem. Com a sua morte a propriedade é transmitida diretamente e imediatamente aos seus herdeiros (princípio da saisine);
Supõe-se que um filho more sozinho com o seu pai durante 9 anos. O pai não é o proprietário tabular dessa casa, pois comprou de um vizinho e nunca registrou o contrato, mas reside neste imóvel há de 20 anos. O genitor falece e o filho, objetivando a usucapião ordinária percebe que cumpre todos os requisitos, exceto o tempo de posse (mínimo 10 anos).
No caso sob análise, o filho não poderia propor a usucapião por não possuir tempo de posse próprio, já que não poderia somar o tempo de posse ao de seu pai pois o bem deriva de um direito de herança. Após exercer o tempo de posse própria e necessária, poderá somar a sua posse com o tempo de posse de seu pai cumprindo o requisito do tempo de posse;
Ressalta-se que, para o somatório, existem alguns requisitos!
Ainda, conforme doutrina de Fábio Caldas de Araújo, além da transmissão intervivos, ou causa mortis, requer-se:
Além disso, para a consolidação do tempo de posse com base na acessio possessionis, não bastará mera prova documental, devendo ser comprovado o efeito exercício de posse pelo requerente da usucapião, conforme já decidido em sede de apelação pelo TJRJ, que nega a soma de posse requisitada- apenas- com prova documental de ‘cessão de direitos possessórios’ (TJRJ. 00041468420078190212. J. em: 27/01/2021).
O tempo de posse, assim como demais requisitos da usucapião, deve ser cumprido para que a usucapião seja caracterizada. Porém, no Direito brasileiro, como supra demonstrado, existem diversas formas de se adquirir esse prazo possessório, a fim de regularizar o seu imóvel;
Quando o Direito limita a aquisição de bem imóvel pela usucapião, com seus diversos requisitos, não visa prejudicar o possuidor, mas- ao contrário- objetiva trazer segurança jurídica a toda sociedade. Isso, uma vez que o direito à propriedade é direito basilar da sociedade democrática brasileira e, caso a usucapião não tivesse qualquer requisito, não haveria nenhuma segurança que a sua propriedade seria realmente sua. Logo, o direito limita, todavia também auxilia, por exemplo, quando se observa o instituto supracitado de ‘soma de posses’.
Advogada e Sócia da Tettu. 20 anos dedicados ao Direito Imobiliário