O instituto da função social tem grande relevância no Direito Imobiliário, sendo constitucionalmente consagrado o princípio do direito a propriedade, conforme disposto no art. 5º,XXII da Constituição Federal de 1988, e que deverá atender a função social do bem;
Daí surge a sua relação. O direito a propriedade fica condicionado ao exercício da função social do imóvel;
Tal instituto, em primeira análise, parece simples, pois já se encontra em nosso cotidiano, todavia é mais complexo e profundo.
Conceituar a Propriedade nunca foi fácil, já que- desde a antiguidade- juristas romanos encontravam dificuldades em relação ao tema. Conforme o jurista Lacerda de Almeida, a propriedade, ao longo do desenvolvimento das sociedades, foi modificando-se de acordo com o regime político do momento, ou de sua criação. Justamente por isso, há, constitucionalmente, uma relativização comum de seu conceito e a atribuição de sua interpretação relacionando-a as leis ordinárias correspondentes;
De toda forma, embora haja essa confusão histórica, o Código Civil pátrio- a fim de tentar pacificar o seu conceito, determinou em seu art. 1228 o que se segue:
Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente apossua ou detenha.
Dessa forma, entende-se, segundo a legislação e a doutrina, que:
“o direito de propriedade como o poder jurídico atribuído a uma pessoa de usar, gozar e dispor de um bem, corpóreo ou incorpóreo, em sua plenitude e dentro dos limites estabelecidos na lei, bem como de reivindicá-lo de quem injustamente o detenha.” (Gonçalves, 2020)
Como explicitado no art.1228 supracitado, o legítimo proprietário assim o é, pois pode usar, gozar, dispor e reaver a coisa. Estes são os conhecidos como elementos constitutivos de uma propriedade. Para melhorar seu entendimento, é válido a explicação do tema em tópicos:
O direito de dispor é considerado, segundo o doutrinador Carlos Roberto Gonçalves, como o mais relevante dos elementos, uma vez que poder transferir e alienar um bem imóvel é o principal atributo, considerado por ele, de um proprietário;
É importante salientar também que a propriedade detém caráter absoluto e ilimitado. Inclusive, no início de sua história, era excessivamente subjetiva e individual, entretanto isso tem mudado nos tempos modernos. O direito brasileiro participa dessa mudança, por isso os direitos dos proprietários passaram por uma grande relativização e redução, conforme o que ensina Carlos Roberto Gonçalves;
Entretanto, o Direito, apesar de reduzir direitos e atribuir limitações, não o faz para o ‘mal’ dos proprietários, mas sim para a melhor segurança jurídica dos bens de sua própria sociedade. A principal modificação relaciona-se com o próprio título deste Blog Post: o princípio da Função Social, que será explicitado agora.
Como ora supracitado, anteriormente e principalmente na idade romana, o direito à propriedade era individualista. Com a modernização do Direito, o princípio da função social começou a se relacionar diretamente com a propriedade;
A origem de tal instituto é atribuída, conforme alguns juristas, a Augusto Comte e postulado por Deguit. Outros defendem que Deguit, de fato, foi quem disseminou a Função Social na sociedade latina e, consequentemente, no Direito Brasileiro;
Deguit, nesse sentido, conceitua o princípio perpetuado por ele da seguinte forma:
(...)a propriedade deixou de ser o direito subjetivo do indivíduo e tende a se tornar a função social do detentor da riqueza
mobiliária e imobiliária; a propriedade implica para todo detentor de uma riqueza a obrigação de empregá-la para o crescimento da riqueza social e para a interdependência social. (...) propriedade não é, de modo algum, um direito intangível e sagrado, mas um direito em contínua mudança que se deve modelar sobre as necessidades sociais às quais deve responder. (...)
Neste contexto, a função social ensina aos proprietários que o seu direito não é único e individual. Neste mesmo cenário o nosso Código Civil afirma:
o direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e
o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas (art. 1.228, § 1º)
Ou seja, qual a relação do princípio da Função Social com o Direito Imobiliário?
Toda! Isso, uma vez que a grande maioria dos direitos reais, tema do ramo imobiliário, versam-se e se baseiam em desdobramentos do direito à propriedade. Logo, naturalmente no direito atual, relacionam-se com o princípio da Função Social.
Advogada e Sócia da Tettu. 20 anos dedicados ao Direito Imobiliário